Na última segunda-feira, 09 de novembro de 2020, a primavera da Várzea teve uma tarde chuvosa. No cemitério do bairro, a família e os amigos se despediram de Seu Pedro Silveira de Souza, Poeta Marginal que por tantos e tantos anos carregou consigo a Biblioteca Itinerante Livre.
Seu Pedro, que de tantas profissões e histórias – de lavrador a químico, de militante político a brincante de Maracatu – deixou seu recado gravado aqui. Apresentou-se como o Plantador de Baobás, pouco tempo antes de partir pra espalhar suas sementes lá do alto.
A primavera da Várzea teve uma tarde chuvosa, pois Seu Pedro, já de prosa lá em cima, deve ter dito pra alguém: ô meu camarada, tem como jogar uma aguinha nos meus Baobás por favor? E vendo de lá também, já chamou outro que passava pra contar como eram as curvas do Rio Capibaribe, antes do Rio ter que desviar do progresso da cidade.
O legado da vida de Seu Pedro, você ainda há de encontrar muitos e muitos anos por aí. Suas raízes no chão da Várzea do Capibaribe, pisado na batida do Maracatu Rural, adubado com poesia, e regado pelas lembranças do Rio de outros tempos, ramificaram lindas árvores de Baobá, que se multiplicam e semeiam novas poesias.
Obrigado seu Pedro, vá em paz!
Por aqui tivemos a honra de contar com sua presença em dois momentos que queremos compartilhar e relembrar com vocês.
O primeiro foi no Poeira Criativa lá em 2016:
O segundo encontro da Rádio com Seu Pedro foi a pouco mais de um mês quando gravamos com ele para o Histórias do Velho Oeste o programa O Plantador de Baobás.
Queremos também deixar registrado aqui um poema escrito por ele:
Testamento, de Pedro Silveira de Souza
(Andarilhando com o Poeta Marginal. p.15, 2019)
Que meu CORPO descanse nas sombras das palmeiras e umbuzeiros
com cheiro de resina e de madeira roxa
e que eu retenha comigo os segredos maravilhosos
que me confiaram os griots, sábios e os reis divinais.
Que meu CORPO descanse nas sombras das palmeiras e umbuzeiros
onde os homens acudiram a todos em peregrinação
Já as escutara pensadoras e silenciosas
ao redor da árvore, cresciam flores selvagens.
Que meu corpo descanse nas sombras das palmeiras e umbuzeiros
nas planícies distantes, onde caminham os zebus brancos
e marcam encontros os griots, pensadores e os enamorados
para observar o voo dos gaviões carcará.
Que meu corpo descanse nas sombras das palmeiras e umbuzeiros
acima da colina cor de sombra queimada
longe dos ruídos dos homens
mas próximos aos rumores divinos.
Perceberei os cantos da caatinga sagrada
onde estarei descansando por fim em uma eterna sombra.
As estrelas acima luzem como cauris á Deus
O céu é como um sudário estendido, na bacia azul
A Ursa maior e Órion, cúmplices, me sorriem dizendo…!
Acorde.
Essa é uma singela homenagem da equipe da Rádio Comunitária Aconchego e do Programa Histórias do Velho Oeste.
Desejamos que Seu Pedro faça uma passagem tranquila e que seja recebido em festa por todas as gerações de Plantadores de Baobás.