Como funciona o estúdio virtual da Rádio Comunitária Aconchego?

Há algum tempo queria ter escrito este texto, mas acordei estes dias e me deparei com o pedido de doações de um software muito importante para nossa Rádio: o AzuraCast. Esse pedido de ajuda me colocou na responsabilidade de compartilhar um pouco deste e de outros projetos que são essenciais para estarmos no ar. Mas antes, um pouco de contexto sobre como nos organizamos hoje.

Pandemia e fechamento do estúdio

Com a pandemia da COVID-19 não foi mais possível usar o estúdio como ponto de apoio, encontros e produção de novos programas. Então, deixamos uma máquina ligada lá no estúdio rodando nossa programação. Neste ponto, a Rádio funcionava como se fosse um estúdio ao vivo, só que não tinha ninguém lá, a gente tinha que acessar o computador da Rádio e fazer uns truques para sairmos ao vivo. Esse processo era bem chatinho e acabamos evoluindo para o cenário atual.

Um estúdio virtual para a Rádio

É importante explicar que existem basicamente dois tipos de computadores: os domésticos (ou de escritório) e os servidores. A diferença entre eles é que os primeiros são construídos para serem usados em tarefas que, de grosso modo, tem início, meio e fim. Quando encerramos nossas atividades o desligamos, e vida que segue! Já os servidores eles são usados de forma ininterrupta, para isso eles são construídos e acomodados de uma forma bem distinta dos computadores domésticos. Em termos gerais eles são mais robustos e precisam de uma refrigeração e acesso à internet constantes. Os locais que acomodam estes servidores são chamados de Datacenters (Centros de Dados).

E o que isso tem a ver com o nosso estúdio?

Tem a ver que nosso PC doméstico estava fazendo atividades de um servidor, sendo que ele não foi preparado para isso. Nem a nossa sala estava adequada para essa atribuição de acomodar um servidor. Neste momento tomamos a decisão de migrar nosso estúdio físico para um estúdio virtual. Este estúdio virtual está localizado em um servidor na cidade de Campinas, na Casa de Cultura Tainã. Mas esse não é um servidor qualquer!

Datacenter Livre e Comunitário

Se você procurar na internet fotos de Datacenters irá topar com prédios enormes, com centenas de corredores repletos de máquinas, fios e leds dando um ar futurista. Por trás dessa imagem está uma constatação quase óbvia, não é algo viável para um movimento social ou coletivo manter um Datacenter. Porém diversos grupos ao redor do planeta desafiam esta lógica criando os chamados Datacenters Comunitários, onde são usados uma mistura de técnicas populares e profissionais de manutenção de máquinas. Nesses espaços há também o reaproveitamento de maquinário, dando sobrevida a peças que estariam perto do fim de sua vida útil. Não significa que estejamos falando apenas de gambiarra e um ambiente underground, mas de uma apropriação da tecnologia para usos comunitários. Algumas vezes com equipamentos mais modernos, outras com gambiarras e equipamentos improvisados, o importante é cultivarmos nossos bits nas nossas casas e coletivos.

Casa de Cultura Tainã

Um destes Datacenters está localizado na Casa de Cultura Tainã. Nele rodamos uma série de softwares, desde de que sejam produzidos também de formas comunitárias (licenças livres ou abertas). Alguns destes softwares são: Jitsi, para video conferência; Nextcloud, para nuvem de armazenamento de arquivos; e – o nosso tema inicial- AzuraCast, para criação de estúdios virtuais e streaming de rádio web.

AzuraCast

Tocado de web rádio. Aparece foto à esquerda do cantor Zé Manoel. No centro o nome do cantar junto com a música em execução "Valsa da Ilusão".
Tocador do AzuraCast

Começamos a usar o AzuraCast com o objetivo de remontar nossa grade de programação, então tínhamos duas missões iniciais: subir nossa biblioteca de músicas e organizar cada seleção em seus horários específicos. Na sequência chegou a vez de programar as vinhetas para tocarem aproximadamente 1 a cada 5 músicas, sendo que algumas listas musicais têm também vinhetas de abertura. Por fim, fomos aprender a programar programas pré produzidos para tocarem nos seus horários determinados. Neste ponto, completamos a programação de tudo que precisávamos “a frio”, ou seja, sem contar com programas ou entradas ao vivo. Apesar do AzuraCast conseguir realizar as entradas ao vivo, até hoje não conseguimos voltar a ter programas “a quente”.

Porém, o AzuraCast não funciona sozinho, por baixo dos panos ele usa outros programas específicos para algumas funcionalidades. Nossa ideia aqui é dar visibilidade a esses nomes que ficam escondidos dentro dos computadores, então vamos rapidamente a eles.

LiquidSoap

Antes de partirmos para o próximo tópico é importante dizer que o AzuraCast, para fazer grande parte da operação e programação da Rádio, utiliza por baixo dos panos o LiquidSoap. O LiquidSoap é uma linguagem de programação desenhada especificamente para a construção de fluxos de áudio, que é a base para as web rádios.

Icecast

Além do armazenamento no estúdio virtual (programas, vinhetas ou músicas) e da programação (organização dos horários para a execução de cada áudio), existe também a função de streaming, ou seja a transmissão do áudio final para nossa audiência. Da mesma forma que o AzuraCast usa o LiquidSoap para agendar os áudios, ele usa o Icecast para a transmissão. Então, uma vez que temos nossos áudios armazenados e programados, eles são executados e enviados para nossa audiência via Icecast.

Conclusão

De forma resumida, uma rádio web pode ser produzida de duas formas: (1) com um estúdio real, onde gravamos os programas e transmitimos o fluxo de áudio ao vivo para um servidor (Icecast), que irá apenas redistribuir para os ouvintes; ou, como apresentamos aqui, (2) via um estúdio virtual onde o servidor armazena e programa toda a grade da Rádio, sendo possível no entanto que a equipe entre ao vivo a qualquer momento.

Na Rádio Aconchego estamos há mais de 2 anos operando no formato de estúdio virtual, utilizando a infraestrutura do Datacenter Livre e Comunitário localizado na Casa de Cultura Tainã. E utilizando o software AzuraCast para gerenciar nossa biblioteca musical e nossa grade de programação. Recentemente, como dissemos no início da postagem, o pessoal do AzuraCast esteve pedindo doações para conseguir sustentar o projeto. Nós ressaltamos para quem puder realizar a doação para o AzuraCast, esta doação é também para a Rádio Aconchego e milhares de outras web rádios ao redor do planeta. Apesar de nos servir muito bem, ainda há vários pontos de melhorias que gostaríamos de ver no AzuraCast, mas para isso precisamos que o projeto esteja saudável economicamente.

Para doações acesse: https://www.azuracast.com/docs/contribute/donate/

Agradecimentos pela colaboração e revisão: Cráudio (@craudio@fe.disroot.org) e à comunidade Áudio e Software Livre